A Doutrina do Inferno: um tema impopular nos dias de hoje. Por Thomas Boston. (1676-1732) Parte II
Pesquisador, Tradutor, Editor e Organizador: Rev. Prof. Dr. Albuquerque G. C.
A punição da perda, em uma total e final separação de Deus, é uma miséria para além do que os mortais podem conceber, e da qual a terrível experiência dos condenados é a única forma de expressar suficientemente. Mas para que tenhamos alguma ideia desse horror, vamos considerar as seguintes ideias:
(1)
Deus é o princípio de todo o bem, portanto, estar separado dEle deve ser o
princípio do mal. Nossa pátria, nossas relações e nossa vida, são boas e,
portanto, ser privado de todas essas coisas é considerado um grande mal, e
quanto melhor uma coisa é, quanto maior será o mal de sua perda. Portanto, Deus
sendo o principal bem, e não havendo bem comparado a Ele, não pode haver perda
maior do que a perda de Deus. O deleite completo de Deus é o mais alto pico de
felicidade que uma criatura pode atingir. Ser totalmente e finalmente separado
dEle, deve ser então o mais baixo degrau de miséria do qual a criatura racional
pode ser reduzida. Ser rejeitado por homens, por bons homens, é doloroso; o que
deve ser então, ser rejeitado por Deus, a bondade em si?
(2)
Deus é a fonte de toda bondade, da qual toda a bondade flui para as criaturas e
pela qual é continuada nelas, e para elas. Qualquer bondade ou perfeição,
natural assim como moral, em qualquer criatura vem de Deus, e depende dEle,
assim como a luz é, e dependente, do sol. Pois cada ser criado, como tal, é
dependente.
Portanto,
uma total separação de Deus, em que toda comunicação agradável entre Deus e uma
criatura racional é absolutamente bloqueada, deve necessariamente trazer consigo
um eclipse total de toda a luz de conforto e facilidade, seja qual for. Se
houver, nem que seja, uma só janela, ou local aberto, em uma casa, e essa casa
for totalmente fechada, é evidente que não pode haver nada mais do que
escuridão nela.
Nosso
Senhor diz ´ Não há bom senão um só, que é Deus ´ (Mateus 19:17) nada bom ou
agradável é originalmente da criatura — qualquer coisa boa ou agradável que
alguém encontre em si mesmo, como a saúde do corpo, paz de espírito — qualquer
doçura, descanso, prazer ou deleite que uma pessoa encontra em outras criaturas,
como comida, bebida, artes e ciências — tudo isso é nada além de um tênue
resplandecer da perfeição Divina, comunicado de Deus para a criatura, e dependente
de uma constante influência dEle para com eles, dos quais falhando, eles
imediatamente seriam extintos — pois é impossível que qualquer coisa criada
possa ser para nós mais ou melhor do que o que Deus a fez para ser.
Todos
os riachos de conforto do qual bebemos, de dentro ou fora de nós, vem de Deus
sendo Ele sua nascente. Se os cursos dos riachos, dos quais bebemos, forem
barrados, necessariamente todos eles deverão secar. Sendo assim quando Deus se
vai, tudo que é bom e agradável se vai com Ele, todo alívio e paz de corpo e
espírito (Oseias 9:12). Ai deles, quando deles eu me apartar!
Quando
os perversos são totalmente e finalmente separados dEle, tudo que é agradável
neles, ou sobre eles, retorna a fonte — assim como a luz vai-se embora com o
sol, e a escuridão o sucede. Assim, em sua separação de Deus, toda a paz é
removida para longe deles, e dor no corpo e angústia na alma, a sucede.
Toda
a alegria se vai, e toda sorte de sofrimentos os toma. Toda calmaria e descanso
é separada deles e eles são preenchidos de horror e fúria. A esperança foge, e
o desespero os toma. Operações comuns do Espírito, que o agora os restringe,
são retirados para sempre, e o pecado atinge seu ponto mais alto. Portanto,
temos uma triste visão do terrível espetáculo do pecado e da miséria, que uma
criatura prova quando está totalmente separada de Deus e deixada por si só, e
nós podemos ter essa separação de Deus como o inferno do inferno. Estando
separados de Deus, eles são privados de todo o bem. As boas coisas das quais eles
colocam seu coração aqui neste mundo são além do seu alcance lá. O homem
cobiçoso não pode desfrutar de sua fortuna lá, nem o homem ambicioso a suas
honras, nem o homem sensual os seus prazeres — não, nem uma gota de água para
refrescar a sua língua (Lucas 16:24,25).
Não
há comida ou bebida para fortalecer o fraco, não há descanso para refrescar o
cansado — não há música, ou companhia agradável, para confortar e animar o sofredor.
E as coisas santas que eles desprezaram no mundo, eles não deverão nunca mais
escutar sobre elas, nem as ver.
Não
há oferta de Cristo lá, não há perdão, não há paz, não há fontes de salvação no
poço da perdição. Em uma palavra, eles devem ser privados de qualquer coisa que
possa os confortar, sendo totalmente e finalmente separados de Deus, da fonte
de toda bondade e conforto.
(3)
O homem naturalmente deseja ser feliz, tendo consciência de que não é
autossuficiente.
Ele
tem um desejo eterno de algo que está fora de si mesmo, para o fazer feliz; e a
alma sendo, por natureza e constituição, capaz de desfrutar de Deus, e nada mais
sendo comensurável aos seus desejos, nunca poderá ter um verdadeiro e sólido
descanso até que descanse no deleite de Deus. Este desejo de felicidade a criatura
racional nunca conseguirá deixar de lado, não, nem mesmo no inferno.
Agora,
enquanto os perversos estão na terra, eles buscam sua satisfação na criatura. E
quando alguma coisa falha, eles escolhem outra, portanto, eles gastam seu tempo
no mundo, enganando suas próprias almas com esperanças vãs.
Mas,
no outro mundo, falhando todo o conforto da criatura, e em um instante
evaporando as sombras das quais eles agora buscam, eles deverão ser totalmente
e finalmente separados de Deus e verão, portanto, que o perderam.
Então
as portas da terra e do céu serão fechadas para eles ao mesmo tempo. Isso irá
surtir neles uma angústia indescritível, ao passo que eles deverão viver sob
uma intensa e dolorosa fome por felicidade, da qual certamente sabem que nunca
será, nem por um pouquinho, satisfeita, tendo todas as portas fechadas diante
deles.
Quem,
então, poderá imaginar o quanto esta separação de Deus deverá deixar os
condenados agoniados em seu coração! O quanto eles irão rugir e se encolerizar
sob essa angústia! O quanto ela irá os aferroar e os roer durante a eternidade!
(4) Os condenados deverão saber que alguns estão perfeitamente felizes, no deleite daquele Deus do qual eles mesmos estão separados; e isso agravará o sentido da perda deles — que eles nunca poderão ter partilha nenhuma com aqueles que estão felizes. Estando separados de Deus, eles estão separados da sociedade dos santos glorificados e dos anjos. Eles podem ver, ao longe, Abraão e Lázaro no seu seio, mas nunca poderão se unir a sua companhia, sendo, como leprosos, com sede fora do campo e excomungados da presença do Senhor, e de todos os Seus santos. Na opinião de alguns, cada pessoa no céu ou no inferno deverá escutar e ver tudo o que se passa nos dois lados. Seja lá o que for dito sobre isso, nós temos base na Palavra para concluir que os condenados deverão ter um conhecimento acurado da felicidade dos santos no céu; pois caso contrário o que mais poderia significar o homem rico no inferno vendo Lázaro no seio de Abraão?
Uma coisa é certa nesse caso, que o próprio tormento deles os dará noção da felicidade dos santos, assim como o homem doente tem noção da saúde, ou o prisioneiro da liberdade. Assim como eles não conseguem falhar em refletir sobre a felicidade daqueles que estão no céu, tendo esperança alguma de se contentar com sua própria condição, também cada pensamento sobre essa felicidade acaba por agravar a perda deles. Seria um momento de grande tormento para um homem faminto, ver outros comendo deliberadamente, enquanto ele está tão amarrado ao ponto de não conseguir sequer uma migalha para saciar seu intenso e doloroso apetite. Trazer música e dança diante de um homem em extremo labor, serviria para aumentar sua angústia. O quanto, então, servirá as canções dos abençoados, em seu deleite de Deus, para fazer os condenados lamentar sob sua separação dEle.
(5)
Eles, então, irão lembrar-se que o tempo em que eles deveriam ter feito parte
da abençoada companhia dos santos, em seu deleite de Deus, se foi — e isso irá
agravar o seu sentido de perda. E lembrarão que houve uma vez uma oportunidade
de fazerem parte; que eles estiveram uma vez no mundo, em algumas esquinas nas
quais o caminho da salvação foi abertamente declarado as vistas dos homens — e
talvez irão desejar ter dado a volta ao mundo, até terem encontrado o caminho
da salvação.
Os
que desprezaram o Evangelho irão lembrar, com amargura, que Jesus Cristo, com
todos os Seus benefícios, foi oferecido a eles — que eles foram exortados,
suplicados e pressionados a aceitar, mas não o aceitavam; e que eles foram
alertados da miséria da qual agora sentem e exortados a fugir da irá que havia
de vir, mas eles não davam ouvidos. A
oferta do Evangelho menosprezada resultará num quente inferno e a perda de um
céu oferecido, será como um peso de uma âncora nos espíritos dos incrédulos na
cova.
Alguns
irão lembrar-se que houve uma probabilidade de serem eternamente felizes no
céu; que uma vez eles pareciam manter-se justos para tal, e que não estavam
longe do reino de Deus; que uma vez eles quase consentiram a abençoada oferta —
a caneta estava em suas mãos, que era, para assinar o contrato de casamento
entre Cristo e suas almas; mas, infelizmente eles derrubaram a caneta e se foram
para longe de Deus, novamente de volta às suas concupiscências.
Outros
vão lembrar que pensavam estar certos da salvação, mas, sendo cegos com orgulho
e presunção, eles ficaram acima das ordenanças e para além da instrução, e não
examinavam seu estado — que foi a sua ruína. Então, eles irão em vão desejar que
tivessem considerado a si mesmos como os piores da congregação, e amaldiçoado a
presunção que tinham de si mesmos, e que outros também tinham de si. Portanto,
irá aferroar os amaldiçoados, o fato de que poderiam ter escapado dessa perda.
(6)
Eles verão que a perda é irreparável – que eles devem permanecer eternamente
sob ela, nunca, nunca, a ser reparada. Se ainda pudessem os condenados, depois
de milhões de gerações no inferno, recuperar o que eles perderam, seria ao menos
alguma esperança, mas o prêmio se foi e nunca poderá ser recuperado. Há duas coisas
das quais irão perfurar os seus corações:
1.
O fato de que eles nunca conheceram o valor da salvação, até que estivesse
irrecuperavelmente perdida — Deveria um homem dar um pote de barro cheio de
ouro em troca de algo sem valor, sem saber o que há dentro até estar quase fora
de seu alcance e sem possibilidade de o recuperar, o quanto esta ação sem
sentido o irritaria, quando descobrisse as riquezas que havia dentro do pote! Tal
caso pode ser uma vaga semelhança com o caso dos que desprezam o Evangelho,
quando no inferno levantarem seus olhos e verem isso para o seu tormento,
aquilo que eles não verão agora para sua salvação.
2.
Que eles perderam a salvação por escória e esterco —venderam sua parte no céu e
não foram enriquecidos com o preço pago. Eles perderam o céu por lucros
terrenos e prazeres e agora ambos se foram deles.
Os
copos do bêbado se foram, o ganho do homem cobiçoso, os deleites carnais do
homem voluptuoso e a facilidade do preguiçoso se foram — nada foi deixado para
os confortar agora. A felicidade que perderam, de fato permanece, mas eles
nunca mais poderão ter parte nela. Aplicação: Pecadores! Sejam persuadidos a
virem a Deus por meio de Jesus Cristo, se unindo a Ele através do Mediador; que
vocês sejam preservados dessa temerosa separação dEle. Oh, tenham medo de viver
em um estado de separação de Deus, com medo de que a escolha que façam agora se
tornem sua punição eterna.
Não
rejeitem a comunhão com Deus, não rejeite a comunhão dos santos, pois será a
miséria dos condenados serem expulsos dessa comunhão. Parem de construir a
parede de separação entre Deus e vocês mesmos, continuando em seus cursos
pecaminosos. Ao invés disso, arrependam-se no presente momento e derribem a parede,
para que a pedra não seja posta em cima e fique para sempre entre vocês e a
felicidade. Tremam ao pensar na rejeição e separação de Deus. Para quem quer
que sejam os homens rejeitados na terra, eles normalmente encontram alguma piedade;
mas, se vocês forem separados de Deus, vocês encontrarão todas as portas fechadas.
Vocês não encontrarão piedade de ninguém no céu, nem santos, nem anjos terão
pena daqueles dos quais Deus totalmente rejeitou. Ninguém terá piedade de vocês
no inferno, onde não há amor, mas somente ódio — todos sendo odiados de Deus,
odiando Deus e odiando um ao outro.
Este
será um dia de perdas e medos. Se eu lhe apresentasse uma perda, você faria bem
em teme-la enquanto houvesse tempo — tema para não perder a Deus, pois se O
perder, a eternidade será gasta em meio a gritos de lamentação por sua perda. Oh
estupidez horrorosa! Os homens têm grande cuidado e preocupação para prevenir
perdas mundanas; mas, eles estão em perigo de perder o deleite de Deus para
todo o sempre; em perigo de perder o céu, a comunhão dos santos, e todas as
boas coisas para o corpo e a alma no outro mundo; porém, estão totalmente
despreocupados quanto a isso, como se fossem mesmo incapazes de pensar sobre!
Oh,
compare este presente dia com o dia do qual o nosso texto fala. Hoje o céu está
aberto para aqueles que até agora tem rejeitado a Cristo; e ainda há lugar, se
eles vierem. Mas, naquele dia as portas se fecharão. ´Agora´ Cristo está
dizendo para vocês, ´Venham!´ ´Então´ será dito — ´Apartai-vos´ vendo que
vocês não viriam quando foram convidados. ´Agora´ a piedade é mostrada; o
Senhor tem piedade de vocês, Seus servos têm piedade de vocês e vos dizem que a
piedade está diante de vocês, e choram para vocês, que não façam mal a vós
mesmos. Mas ´então´ vocês não terão piedade de Deus nem dos homens.
Pesquisador, Tradutor, Editor e Organizador: Rev. Prof. Dr. Albuquerque G. C.
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