quinta-feira, 18 de agosto de 2022

 

Confissão de Fé Ortodoxa Calvinista Patriarca Cyril Lucaris (1629).

O autor da confissão o Patriarca Ecumênico de Constantinopla; Papa e patriarca de Alexandria; Hieromartyr Cyril Lucaris ou Loukaris Patriarca grego de Alexandria como Cyril III e Patriarca Ecumênico de Constantinopla como Cyril I (nascido em 13 de novembro de 1572, Candia, Creta, república de Veneza [agora na Grécia] - morreu em 27 de junho de 1638, a bordo de um navio no Bósforo [Turquia]), foi o patriarca de Constantinopla que lutou por reformas ao longo das linhas protestantes calvinistas. Seus esforços geraram ampla oposição tanto de sua própria comunhão ortodoxa quanto dos jesuítas.

Pesquisador, Tradutor, Editor e Organizador: Rev. Prof. Dr. Albuquerque G. C.


A INFLUÊNCIA PROTESTANTE:

Lucaris seguiu seus estudos teológicos em Veneza e Pádua e, quando estudou em Wittenberg e Genebra, sofreu a influência do calvinismo e desenvolveu um forte desgosto pelo catolicismo romano. Em 1596, o patriarca de Alexandria, Meletios Pegas, enviou Lucaris para a Polônia para liderar a oposição ortodoxa à União de Brest-Litovsk, que havia selado uma união do metropolitano ortodoxo de Kiev com Roma. Por seis anos Lucaris serviu como reitor da academia ortodoxa em Vilnius (agora na Lituânia). Em 1602 foi eleito patriarca de Alexandria e em 1620 foi eleito patriarca de Constantinopla.

 

A CONFISSÃO DE FÉ “CALVINISTA ORTODOXA”:

 

Como patriarca, Lucaris procurou promover seus propósitos calvinistas enviando jovens teólogos gregos para universidades na Holanda, Suíça e Inglaterra. Foi um desses estudantes, Metrophanes Kritopoulos, o futuro patriarca de Alexandria, que descobriu a sua Confissão de Fé, que havia sido escrita por Lucaris em latim e publicada em Genebra em 1629.

 

Em seus 18 artigos, Lucaris professava virtualmente todas as principais doutrinas da fé. Calvinismo; predestinação, justificação pela fé somente, aceitação de apenas dois sacramentos (em vez de sete, como ensinado pela Igreja Ortodoxa Oriental), rejeição de ícones, rejeição da infalibilidade da igreja, e assim por diante.

 

Na Igreja Ortodoxa, a Confissão iniciou uma controvérsia que culminou em 1672 em uma convocação de Dositheus, patriarca de Jerusalém, de um conselho da igreja que repudiava todas as doutrinas calvinistas e reformulava os ensinamentos ortodoxos de maneira a distingui-los do protestantismo e do catolicismo romano.

 

PERSEGUIÇÃO E MARTÍRIO:

 

Lucaris foi forçado a renunciar cinco vezes através das intervenções dos embaixadores da França e da Áustria ao sultão otomano Murad IV (reinou de 1623 a 1640). Seu retorno ao cargo patriarcal foi efetivado em cada ocasião pela ajuda de diplomatas protestantes britânicos e holandeses. Ele foi finalmente denunciado perante o sultão como um traidor que tentou incitar os cossacos contra os turcos, e Lucaris foi condenado à morte e estrangulado por seus guardas otomanos.

 

Após a sua morte, o Sínodo de Dositheus (1672) declarou que Cyril era culpado de "receber as sagradas Escrituras despojadas das exposições dos santos Padres da Igreja" e também de negar "as tradições que obtiveram desde o início começando em todo o mundo, sem as quais a nossa pregação seria reduzida a um nome vazio” (Balmer 1982: 54). O Patriarca Ortodoxo Oriental Dositheus também enfatizou que a Igreja Oriental não pode ser considerada inferior às Escrituras Divinas. Ele também declarou que era correto sustentar que a Igreja pode errar em seu ensino. Tão severas foram essas condenações que “clérigos e leigos foram proibidos, sob pena de suspensão e excomunhão,” de comprar, receber ou ler a tradução do Novo Testamento de Lucaris (Vaporis 1977: 241). No total, seis conselhos ortodoxos orientais condenaram Lucaris e sua teologia como heréticos. No entanto, ainda hoje ele é visto como um santo e mártir na Ortodoxia Oriental.

 

CANONIZAÇÃO:

 

Em 2009, Cyril foi canonizado como mártir pelo Patriarcado de Alexandria na Igreja Patriarcal de São Salvador O Santificado, em Alexandria. Contudo, mais uma vez em 2016, o Sínodo Pan Ortodoxo e o Sínodo de Jerusalém, os anátemas contra Lucaris foram novamente endossados. O legado de Lucaris ainda hoje é uma questão complicada para a Ortodoxia Oriental. A Confissão da fé Cristã Oriental foi publicada em Latim no ano de 1629 em Genebra, contendo a doutrina Calvinista.

 

A CONFISSÃO:

 

Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, Cyril o Patriarca de Constantinopla, publicou esta breve confissão para o benefício daqueles que se perguntam sobre a fé e a religião dos gregos, os quais são da Igreja Oriental, no testemunho a Deus e aos homens e com uma consciência sincera e sem dissimulação.

 

Capítulo 1 - Nós cremos em um Deus, verdadeiro, Todo-poderoso e em três pessoas, Pai, Filho e Espírito Santo; o Pai eterno, o Filho gerado do Pai antes do mundo, consubstancial com o Pai; o Espírito Santo procedente do Pai através do Filho, tendo a mesma essência com o Pai e com o Filho. Nós chamamos essas três pessoas em uma essência de a Santíssima Trindade, para sempre ser bendito, glorificado e adorado por toda criatura.

 

Capítulo 2 - Nós cremos na Santa Escritura dada por Deus, não tendo outro autor além do Espírito Santo. Isto devemos acreditar sem dúvida pois assim está escrito. E nós temos a mais certa palavra profética, a qual você faz bem em prestar atenção, como a uma lâmpada brilhando em um lugar escuro. Nós cremos na Autoridade das Sagradas Escrituras que está acima da autoridade da Igreja.

Ser ensinado pelo Espírito Santo é algo muito diferente do ser ensinado por um homem; pois o homem pode através da ignorância errar, enganar e ser enganado, mas a palavra de Deus não engana nem é enganada, nem pode errar, ela é infalível e tem autoridade eterna.

 

Capítulo 3 - Nós cremos que o Deus misericordioso predestinou Seus eleitos para a glória antes da fundação do mundo, esta eleição não é por nenhum aspecto de obras e nenhuma outra forma impulsiva, mas somente através da vontade e misericórdia de Deus. Desta maneira, antes da criação do mundo, semelhantemente Deus rejeitou quem Ele queria, por um ato de reprovação; se você considerar a conduta absoluta de Deus, a causa é a Sua vontade; mas se você olhar para as leis e os princípios da ordem divina, os quais a providência de Deus faz uso no governo do mundo, a causa é a Sua justiça, pois Deus é misericordioso e justo.

 

Capítulo 4 - Nós cremos em um Deus Trino, o Pai, o Filho e o Espírito Santo, Criador de todas as coisas visíveis e invisíveis. Coisas invisíveis chamadas anjos, e visíveis chamadas céus e todas as coisas debaixo dele. E porque o Criador é bom por natureza, Ele criou boas todas as coisas, e Ele não pode criar nenhum mal; se existe algum mal, este procede do Diabo ou do homem. Pois, deve ser uma regra clara para nós, que Deus não é o autor do mal, tampouco do pecado, e nada disso ser a Ele imputado por qualquer razão.

 

Capítulo 5 - Nós cremos que todas as coisas são governadas pela providência de Deus, que devemos antes respeitar do que buscar entender. Uma vez que está além da nossa capacidade, nem podemos realmente entender a razão por detrás de todas as coisas. Dessa maneira supomos que é melhor adotar o silêncio em humildade do que falar de coisas que não edificam.

 

Capítulo 6 - Nós cremos que o primeiro homem criado por Deus, que estava no paraíso, caiu porque ele negligenciou o mandamento de Deus e se rendeu ao conselho enganoso da serpente. A partir de então surgiu o pecado original para sua posteridade, de modo que nenhum homem nasce sem que sua carne carregue este fardo e sinta seus frutos em sua vida.

 

Capítulo 7 - Nós cremos que Jesus Cristo nosso Senhor esvaziou-se de Si mesmo, Ele assumiu a natureza humana em sua própria substância. Ele foi concebido através do Espirito Santo no ventre da virgem Maria, nasceu, passou pela morte, foi sepultado, e ressuscitou em glória, para que pudesse trazer salvação e glória a todos os fiéis, e que virá julgar os vivos e os mortos.

 

Capítulo 8 - Nós cremos que nosso Senhor Jesus Cristo está sentado à direita do Pai e intercede por nós, executando sozinho o ofício de sumo sacerdote e mediador e que, de lá, cuida e governa Sua igreja, adornando-a e enriquecendo-a com muitas bênçãos.

 

Capítulo 9 - Nós cremos que sem fé nenhum homem pode ser salvo. E nós necessitamos da fé que justifica em Cristo Jesus, pela qual a vida e a morte de nosso Senhor Jesus Cristo é conhecida através do Evangelho anunciado, e sem a qual nenhum homem pode agradar a Deus.

 

Capítulo 10 - Nós cremos que a Igreja, denominada Católica, inclui todos os verdadeiros fiéis em Cristo, aqueles que tendo partido de sua pátria estão no paraíso e aqueles que permanecem na terra e estão ainda a caminho. O Cabeça da Igreja (pois um homem mortal de modo algum pode ser) é somente Jesus Cristo, e Ele mantem o leme do governo da Igreja em Suas próprias mãos. Pois, por mais que existam na terra Igrejas particularmente visíveis, todas têm um dirigente, o qual não deve ser propriamente chamado [cabeça] da Igreja em particular, senão indevidamente, pois ele é o principal membro da mesma.

 

Capítulo 11 - Nós cremos que os membros da Igreja Católica são santos, escolhidos para a vida eterna, para unidade e comunhão, da qual os hipócritas são excluídos, embora nas igrejas visíveis o joio possa ser encontrado em meio ao trigo.

 

Capítulo 12 - Nós cremos que a Igreja na terra é santificada e instruída pelo Espírito Santo, pois Ele é o verdadeiro consolador, o qual Cristo enviou através do Pai para ensinar a verdade e expulsar as trevas, para a compreensão do fiel. Pois é verdadeiro e certo que a Igreja na terra pode errar, escolhendo o engano ao invés da verdade, erro do qual a luz e a doutrina do Espirito Santo nos livra, não através do homem mortal; ainda que possa ser realizado por intermédio do trabalho dos fiéis ministros da Igreja.

 

Capítulo 13 - Nós cremos que o homem é justificado pela fé e não por obras. Mas, quando dizemos pela fé nós entendemos a correlação ou a finalidade da fé, que é a justiça de Cristo, o qual, por seu poder, faz a fé apreender-se e aplicar-se em nós para nossa salvação. Dizemos isso sem nenhum detrimento das boas obras, pois a própria verdade nos ensina que as obras não devem ser negligenciadas, que elas são um meio necessário para testemunhar nossa fé e confirmar nosso chamado. Mas, a fraqueza humana mostra-se enganosa com essas obras como sendo suficientes à nossa salvação, e, por seus próprios méritos, nos capacitar a aparecer diante do tribunal de Cristo e nos outorgar a salvação; somente a justiça de Cristo, sendo aplicada ao penitente, justifica e salva o fiel.

 

Capítulo 14 - Nós cremos que o livre arbítrio está morto no pecador, pois ele não pode fazer nada de bom, e tudo quanto fizer é pecado; porém no regenerado, pela graça do Espírito Santo, seu arbítrio é suscitado e de fato funciona, mas não sem o auxílio da graça. O preceito, portanto, é que o homem esteja primeiro debaixo da graça, para nascer de novo e fazer o bem; caso contrário o homem é ferido recebendo quantas feridas um homem pode receber, como aquele que indo de Jerusalém a Jericó caí nas mãos de ladrões, de modo que ele não pode fazer nada por si mesmo.

 

Capítulo 15 - Nós cremos que os Sacramentos Evangélicos da Igreja são aqueles instituídos pelo Senhor através das Escrituras, e são dois; Ele que os estabeleceu, os quais foram entregues a nós, não nos entregando nenhum outro. Além disso, nós cremos que eles consistem da Palavra e dos Elementos, os quais são os selos das promessas de Deus, e conferem graça. Mas, para o Sacramento ser total e completo é necessário que uma substância terrena e uma ação externa cooperem juntamente com a verdadeira fé, no uso deste elemento ordenado por Cristo nosso Senhor, pois a deficiência da fé prejudica a integridade do Sacramento.

 

Capítulo 16 - Nós cremos que o Batismo é um sacramento instituído pelo Senhor, e a menos que o homem o tenha recebido, ele não tem comunhão com Cristo, do qual a morte, sepultamento e a gloriosa ressurreição procedem toda a virtude e eficácia do Batismo; portanto, estamos certos que aqueles que são batizados da mesma maneira que nosso Senhor ordenou nas Escrituras, tanto os pecados originais quanto os atuais são perdoados, de modo que todo aquele que foi lavado em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo é regenerado, purificado e justificado. Mas, com relação à repetição deste, não temos ordem para sermos rebatizados, portanto, devemos nos abster dessa prática indecente.

 

Capítulo 17 - Nós cremos que o outro sacramento que foi ordenado pelo Senhor é o que chamamos de Eucaristia. Pois na noite em que o Senhor se entregou, Tomou Jesus um pão, e, abençoando-o, o partiu e o deu aos seus discípulos dizendo: Tomai, comei; isto é o meu corpo; depois, tomou um cálice e, tendo dado graças, o deu aos discípulos, dizendo: bebei todos dele, pois este é meu sangue derramado em favor de muitos; fazei isto em memória de mim. E Paulo adiciona, “Porque todas as vezes que comerdes este pão e beberdes deste cálice, anunciais a morte do Senhor”. Esta é a pura e legítima fundação deste maravilhoso Sacramento, na administração da qual professamos a verdadeira e certa presença de nosso Senhor Jesus Cristo, presença esta, entretanto, que a fé nos oferece, não aquela que a inventada doutrina da transubstanciação ensina. Pois nós acreditamos que o fiel toma o corpo de Cristo na Ceia do Senhor, não rompendo seu corpo com os dentes, mas percebendo com consciência e sentimento da alma, visto que o corpo de Cristo não é aquele visível no Sacramento, mas aquele à qual a fé nos oferece e recebemos espiritualmente e; de onde é verdade que, se nós cremos, nós comemos e participamos, e se não cremos, somos destituídos de todo o fruto deste. Nós cremos, consequentemente, que beber do cálice no Sacramento é ser participante do verdadeiro sangue de nosso Senhor Jesus Cristo, da mesma maneira como nos afirmou do corpo; pois como o Autor ordenou a respeito do Seu corpo, assim Ele fez a respeito de Seu sangue; mandamento o qual não deve ser desmembrado nem mutilado, de acordo com o desejo e arbítrio do homem; mas antes o instituto deve ser mantido como nos foi entregue. Quando, portanto, somos participantes do corpo e sangue de Cristo dignamente e por completo, nós nos reconhecemos como sendo reconciliados, unidos com o nosso Cabeça num mesmo corpo, com a clara esperança de sermos co-herdeiros no Reino vindouro.

 

Capítulo 18 - Nós cremos que as almas dos mortos estão ou na bem-aventurança ou na condenação, de acordo com o que cada um fez, pois tão logo que deixam seus corpos eles avançam para Cristo ou para o inferno; pois, como um homem é encontrado em sua morte, assim ele é julgado, e após esta vida não existe possibilidade ou oportunidade de arrependimento; nesta vida há um tempo da graça, portanto, aqueles que são justificados aqui não sofrerão punição no futuro; mas aqueles que morrem, não sendo justificados, são enviados para a punição eterna. Pelo qual é evidente que a ficção do Purgatório não deve ser admitida, mas na verdade é determinado que cada um deve se arrepender nesta vida e obter a remissão de seus pecados através de nosso Senhor Jesus Cristo, e será salvo. E, deixe este ser o fim. Esta breve Confissão que anunciamos será um sinal falado contra aqueles que têm o prazer de nos caluniar e nos perseguir. Mas confiamos no Senhor Jesus Cristo e esperamos que Ele não renuncie à causa dos Seus fiéis, nem que a vara da maldade dos perdidos recaia sobre os justos. Datada em Constantinopla no mês de março de 1629. Cyril, Patriarca de Constantinopla.

Pesquisador, Tradutor, Editor e Organizador: Rev. Prof. Dr. Albuquerque G. C.

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